segunda-feira, 28 de abril de 2014

Paz e saudade...

Boas.

Há um preço a se pagar quando nós deixamos de ser nós mesmos. Um dia desses (o relato está aqui, no post Faroeste Caboclo), eu paguei o meu. Fiz tudo da forma que nunca faço. Deixei de ser eu mesmo. Doeu. Briguei com o mar e, claro, perdi. Domingo de manhã, em contrapartida, fiz do mar meu amigo e ele me levou para onde eu queria ir. A coisa é simples assim. Tentar fazer diferente é a receita do fracasso.



O combalido Control, sem o cabeçote.

O novo cabeçote.

Sábado, 26, o novo cabeçote foi finalmente instalado. No domingo, 27, soltei a poita às 06h21 e segui no motor, em solitário. O céu não tinha nenhuma nuvem. A previsão era de calmaria até às 09h00, quando um ventinho de SW/S entraria na casa dos oito nós (ou seja, vento a favor). O fundo estava limpo, apesar de eu não raspá-lo desde 10/03 (Ilhabela é um bom lugar para não se ter cracas). O canal de São Sebastião estava um espelho. A maré vazava lentamente e seguiamos em boa velocidade, com apenas duas mil rpm.

Passando a Ponta das Canas, ganhamos o mar aberto, com a proa na Ilha Anchieta. A visibilidade era excelente, dando para ver até mesmo a Ponta Negra!  Mar baixo, apesar do aviso de que uma ressaca chegaria ao litoral de Ubatuba nas próximas horas. O motor trabalhou perfeitamente, sem um único incidente. Ele voltou a ser ele mesmo e não esquentamos mais a cabeça.

Às 08h30 abri a genoa, aproveitando um terral que entrou sem ser esperado. Boa surpresa. Ganhei um nó. Na aproximação com a Ilha do Mar Virado, uma hora depois, a questão: passar por fora ou por dentro? Aliás, aquela região não tem esse nome sem motivo, pois mesmo em um dia de mar baixo a ondulação se fazia sentir.

O mar...

Por fora é mais seguro, mas o caminho fica maior. Por dentro, se a maré estiver enchendo (era o caso naquele horário), o barco segue mais rápido (com maré vazando é um inferno). Mas há uma ilhota e algumas lajes submersas e perigosas no meio do caminho. Como havia vento (a essa altura, já entrando de S) e eu não dependeria apenas do motor, escolhi passar por dentro. A velocidade aumentou e passei bem perto da Ilha, com as lajes por bombordo. 

Voltei alguns anos no tempo. Quando eu era criança e brincava na praia de Santos, no canal três - em frente a Avenida Conselheiro Nébias, onde crescri. Desde então as ilhas oceânicas sempre me pareceram um local inalcansável e inóspito. Hoje, além de passar por elas com certa frequência, me surpreendo com a quantidade de vida que há nelas e que passa sem ser notada por quem está na praia. Não tenho como não pensar na ironia que é a vida de seus habitantes (são muitos) seguir indiferente a nossa presença na cidade de concreto. Os pesacadores caiçaras sabem bem do que estou falando.

... meu amigo, minha segunda casa.

Às 11h30  cheguei na Ribeira, acompanhado por dois golfinhos curiosos. A Priscila vai me matar, mas a sensação foi de "voltar para casa", por mais que nossa presença lá seja efêmera (ela odeia o barco longe de casa, não sem motivo). A poita que era usada pelo Malagô está com o Maluí. Joguei ferro bem perto do Superbakanna (meu ex-vizinho de Boreal) e fui saudado pelo Erom e pela Selma, no Gigante, que tiraram um sarro da minha faina desajeitada. "- Faz um ano que não ancoro" - expliquei - "A gente só ancora em locais bonitos!" - completei.

Acabei alugando uma poita ali pertinho, pela bagatela de R$ 200,00 por mês - quando na Ilhabela eu paguei R$ 50,00 por dia! - e fiquei trinta e três ias lá. Dei uma geral no barco e tomei o caminho de casa. Achei que teria um sorrisinho vitorioso nos lábios, pois dessa vez havia conseguido quando da outra, falhado. Mas não. Tinha em meu coração apenas uma paz enorme, que apenas estar só, no mar, traz. Tinha tambpem uma saudade louca das meninas. Paz e saudade é o que havia em meu coração e isso aconteceu somente porque eu havia sido eu mesmo. Por isso, cheguei ali. 

E vamos no pano mesmo! 





quarta-feira, 23 de abril de 2014

Um sem teto do mar...

Boas!

Estou sem atualizar o blog já faz algum tempo, mas muita água correu por baixo dessa quilha nesse meio tempo. Eu aproveitei para evitar escrever uma linha que fosse, pois lançar palavras ao vento quando se está com raiva é algo que se deve evitar (e eu ainda aprendo a fazer isso em todas as situações).

O Malagô está na Ilhabela. Comprei um cabeçote novinho, para evitar mais defeitos, serviço mal feito e a demora no conserto (mesmo tendo ficado muito mais caro do que apenas retificar). Tomei o cuidado de eu mesmo comprar a peça, identificá-la e remerter ao mecânico. Mas... nessas horas é fácil perder a fé no ser humano. As pessoas, algumas pessoas, simplesmente não conseguem se organizar (quero crer que seja isso) e se perdem nos próprios equívocos. Até ai seria apenas problema delas, se não nos levassem junto.



Até pensei em cobrar na Justiça meus prejuízos. Mas e na próxima dor de barriga, com quem irei contar? Essa falta de concorrência de nível no mundo náutico é um dos fatores que faz com que a coisa seja essa bagunça generalizada.

De minha parte, nesse momento, estou aceitando a tese budista de que nós estamos no local onde precisamos estar. Até porque simplesmente não tenho opção.



Meu orçamento foi para o espaço e precisei fazer uma reengenharia, para não falir. Sair da Marina Boreal foi a primeira delas. Uma conta a menos. Só que nessa acabei virando um sem teto do mar. Nesse exato momento estou na Ilhabela e não tenho para onde voltar. O mais engraçado é que eu gosto dessa situação (gostaria mais se ela fosse por escolha, mas tudo bem).

No final de semana antes do feriado fiz o básico 02 com o Cassio e a Chritiane, no Meltemi - aliás que delícia é acabar a aula e poder ir embora sem ficar arrumando o barco, já que o Meltemi tem um super marinheiro que faz tudo. Fomos até a Ilha da Moela e montamos a ilhota Pau a Pino, em um dia de sol e ventos variáveis. Havia a previsão de entrada de um forte NW/SW, que de fato entrou: 42 nós na rajada! A sorte é que o ventão não obedeceu o relógio e ao invés de entrar no meio da tarde, como previsto, veio às 20h00, quando já estavamos longe do barco.





Na quinta pegamos o jipe e fomos para Ilhabela da Princesa. Eu estava receoso, pois a infra de apoio no local é praticamente nula. Há um taxiboat, que funciona quando quer e banheiro, apenas o do barco. Por mim tudo bem, mas com três meninas e a Barla-Sota (nossa nova cachorrinha - e sim, eu fui voto vencido),poderia ser complicado. Busquei pousadas, mas sem sucesso. Por conta do feriadão quem não tinha reservas estava frito. Era o nosso caso.



Para minha surpresa as meninas tiraram essa situação melhor do que eu. Brincavam na praia o dia todo e a noite, depois de contarmos histórias, dormiam na batedeira - o que também acharam legal. Não importa o quanto você pensa que conhece as mulheres. Você nunca as conhece por inteiro.

E é isso ai, vamos sem opção mesmo!



segunda-feira, 7 de abril de 2014

Turma 04/2014

Boas!

Depois de eu quase implorar de joelhos, o mecânico finalmente foi ao Malagô tentar resolver meu problema do aquecimento de um jeito que eu pudesse sair de Ilhabela e seguir para Ubatuba sem tentar me matar. Mas a coisa, como eu suspeitava, era um pouco mais séria. O cabeçote precisa de reparos mais intensivos e eu, mesmo sabendo do custo, estou muito inclinado a colocar um novinho. A bem da verdade, estivesse o câmbio mais amistoso eu colocava era logo um Yanmar, mas dessa vez não dá me$mo! Nessas horas dá uma saudade do motor de popa... (mas só nessas horas, rs).

Porém, contudo, todavia e entretanto a vida não pára e a agenda de alunos tem que seguir. Temos aulas até junho. Em julho o barco sobe para manutenção e atividades náuticas somente a partir de agosto.

Nisso apelei para a ajuda dos amigos e consegui um barco "emprestado", o Meltemi, do meu amigo Alan (que foi conosco) - um projeto do Bruce Farr de 32,5 pés, embrião dos veleiros MJ. Ao que me consta foram feitos apenas dois desses barcos pelo mesmo estaleiro dos MJ. A aula seria no melhor barco do mundo: o barco do amigo!

Fizemos o básico 01, como de costume.Como o barco era um pouquinho menor e aproveitando três adiamentos para maio, reduzi o número de alunos de quatro para dois. Na tripulação, então, Luciano e Gustavo, duas figuras gente boa e de conversa fácil que tocaram o barquinho de forma muito eficiente e sem sustos em uma tarde perfeita:  mar de almirante, nenhuma nuvem no céu, sol ameno e ventos de leste entre 10 e 18 nós!  

Na volta para a marina encontramos o Alexandre e a Luiza, do Superbakanna, que assim como eu estão de mudança da Boreal. Eles vão para a Ribeira. Já eu vou para algum lugar entre ali e aqui.

E vamos no pano mesmo!

Galeria:


Luciano...

... e Gustavo.





terça-feira, 1 de abril de 2014

Buja de trabalho.

Boas!

Eu já devo ter dito por aqui que equilíbrio é a palavra chave na arte de velejar. A quantidade de "pano" exposta influencia diretamente o comportamento do barco. Se ele ficará mais ardente, querendo se afilar ao vento orçar), ou se ao contrário ele irá buscar receber o vento pela popa (tendência perigosa), é uma questão de equilíbrio entre quilha, leme e o velame exposto (e a forma como ele está exposto, leia-se, regulagens de mastro).

A "Storm Sail", nesse cenário, pode não ser a vela mais adequada para as condições de clima do Brasil, em especial do litoral do Sudeste - embora seja a vela de mau tempo predominante em nossos barcos. Isso porque para ela ser eficiente precisa haver vento em uma velocidade poucas vistas por aqui (felizmente!). Trinta nós de vento é uma condição de vento dura, mas ainda não é o fim do mundo. A coisa pode ficar muito, muito pior!

Na maioria de nossas "porrancas", em especial entradas de frentes frias, o vento fica na casa dos 30 nós e nessa condição há um hiato entre a buja (LP 100% de J) e a storm sail propriamente dita. Quer dizer: se a buja fica grande demais, a storm pode ficar menor do que o necessitamos.

No Malagô adotei a seguinte solução: mandei fazer uma buja de trabalho, que é um pano intermediário entre  a buja e a storm. Mas não parei por ai: essa buja de trabalho permite seja feita uma forra de rizo, o que a transforma imediatamente em uma storm sail (que eu pretendo nunca  precisar usar!).

Foi com a buja de trabalho que fizemos praticamente toda nossa travessia de Guarujá até Ilhabela e ela está sempre pronta para uso no paiol de velas, que fica na proa.  A fizemos na cor laranja, pois resta comprovado que em condições de baixa visibilidade essa é a cor que mais se destaca no mar. Fizemo-la (bonito isso, não?) também super reforçada, que é para aguentar o tranco.



Algo que observamos na prática é que uma vela só força muito o estai de proa. O ideal é colocar a mestra bem rizada (no Malagô seria na segunda forra, mas há veleiros com mais) ou usar uma try-sail - mais ai é outra história... 

E vamos esperando o mecânico mesmo...