quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

O milagre é cada novo dia...

Boas!

Em abril desse ano um aluno de nossa escola de vela provocou uma emoção diferente em mim. Receoso por ter um pouco mais do que cinquenta anos, ele chegou um tanto hesitante. Expliquei que isso era normal, que muitos de nossos alunos eram dessa faixa etária, que o campeão tinha oitenta e dois anos e que a vela permite uma longevidade rara em outras atividades ao ar livre. Imaginava que era mais uma história "padrão", quando então veio a surpresa. "- Há trinta e poucos anos" - começou ele - "eu fui passar minha lua de mel em Paraty. Um dia nós estávamos em uma praia e eu vi um veleirinho amarelo ancorado. De entro dele saiu o pai, a mãe e dois filhos, que logo pularam na água e começaram a nadar. Eu imediatamente apontei para aquele barquinho e disse para minha mulher: 'É aquilo o que eu quero para a gente!' Ela, porém, retrucou imediatamente: 'Pois não conte comigo! Naquilo eu não entro!' Então, durante mais de trinta anos eu alimentei em mim o sonho de velejar, de estar um dia naquele veleiro amarelo e hoje estou aqui para fazer a minha primeira aula".    

O que dizer diante de um relato tão pessoal? Eu o parabenizei, tocado pela sinceridade com que ele se abriu e imaginando como deve ser alimentar na alma um sonho por mais do que trinta anos... Nosso aluno, então, embarcou pela primeira vez em um veleiro para sua primeira aula, em Guarujá.

Após a primeira hora, contudo, ele  esteva verde. Logo ficou  azul evoluindo para um raro tom de roxo e já tinha vomitado as refeições dos últimos sete dias, no mínimo. Não teve jeito. Tivemos que desembarcá-lo antes do previsto.

Telefonei mais tarde para ele, mas não obtive resposta. No dia seguinte estava programada nossa segunda aula. Os outros três alunos chegaram na hora, como previsto, mas ele não estava lá na ponte. O tempo foi passando e a cada minuto eu perdia a esperança de vê-lo novamente.

Mas eis que no último instante ele surgiu. Camiseta branca, bermuda azul claro, mochila pendurada no ombro, um boné Cusco Baldoso e um baita sorriso no rosto. 

"Eu ia voltar para casa - disse -  Mas não ia conseguir desistir depois de ter chegado tão perto. Liguei ontem para minha mulher e ela me disse que sabia que eu não ia aguentar, que aquilo não era para mim. Ao ouvir isso eu tirei forças sei lá de onde, achei uma pensão no canal  dois para passar a noite e me recuperei. Hoje estou aqui!

Caramba! Qual o tamanho da força de um sonho? Eu estava tendo uma aula sobre isso ali.

Nosso aluno fez sua segunda aula e a terceira também.  Depois disso fez uma travessia em situações complicadas entre Ubatuba e Ilhabela, retornando para Ubatuba. Por muito pouco não foi conosco até Buenos Aires e por menos ainda não retornou. Hoje ele é um velejador. Nunca mais enjoou. Mais importante do que isso: ele realizou seu sonho e fez seu pequeno milagre.

Escolhi essa história para postar aqui na última mensagem de 2015 pois quase sempre apenas nessa época somos tomados pela impressão de que tudo se renova, de que no dia primeiro de janeiro tudo será diferente. Mas a verdade é que cada amanhecer é um pequeno milagre, todo santo dia. Cada novo segundo é uma nova chance de virar a mesa e mudar tudo. Não espere pelo natal para mudar sua vida, para tirar planos da gaveta ou sonhos da alma. Não aguarde o ano novo para se livrar do que lhe drena a vida. Não se adapte ao que lhe consome e mata aos poucos, dia após dia.  Faça de cada novo dia seu pequeno milagre.

Feliz tudo, pessoal! Obrigado pela presença de sempre. Bons ventos, e estrelas à barla!

E vamos no pano mesmo!!!

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Ação Social - Natal no Montão de Trigo

Boas!

Como minha família faz há alguns anos, estamos arrecadando donativos para as crianças que vivem na ilha Montão de Trigo, em São Sebastião/SP. 

O Montão é aquela ilha que fica no meio do caminho entre a Moela e Ilhabela e que nunca chega em nossa proa, rs. Ali é o lar de cerca de 20 famílias que vivem basicamente da pesca, mantendo algumas tradições caiçaras. 

Precisamos de doações de 1 kg de alimento não perecível, leite em pó e brinquedos para as crianças (são dezessete crianças com idades entre zero e doze anos). Quem puder contribuir basta levar qualquer doação desses itens na sede Náutica do Clube Internacional de Regatas aos sábados e domingos pela manhã a partir de 28/11. 

Eu estarei lá para receber no Veleiro Malagô. As doações serão levadas para a ilha em veleiros no dia 19 ou 20/12, a depender da previsão do tempo. Participe! Bons ventos e vamos no pano mesmo! Detalhes de como chegar ao local "in box".

Apoio: ABVC Santos e Clube Internacional de Regatas.


segunda-feira, 23 de novembro de 2015

A primeira vez, de novo...

Boas!

Sábado de manhã o dia amanheceu cinzento, em contraste com a sexta anterior de céu azul e sol forte. Encontrei o Eduardo Colombo ainda na ponte Edgard Perdigão antes das 9h30. Ao embarcar na catraia que leva até a sede náutica do Clube Internacional de Regatas vi no caderno de embarque que pouca gente estava por lá e era assim mesmo que eu queria. Desde o dia anterior estava conversando com o Malagô sobre a gente dar uma volta e esse seria o dia.

(C) Eduardo Colombo
Devo confessar que a relação que eu tenho com esse barco nem sempre é fácil e acordá-lo depois de oito meses sem velejar me deixava nervoso. Eu simplesmente não sabia se ele estava com a mesma vontade que eu... Se ele quisesse ficar no píer, acreditem, haveria pouca coisa no mundo que o faria mudar de ideia. O Malagô é um veleiro muito, mas muito teimoso. 

(c) Eduardo Colombo

O fato é que eu não estou reconstruindo o barco inteiro à toa e eu iria tentar. Eu e o Eduardo embarcamos e de forma discreta começamos a retirar os trezentos toldos e capas... Fui até a Dona Lúcia e peguei duas cocas, uma água e dois quibes. O Edu é um cara legal e tem uma  qualidade que eu aprecio muito: só fala quando é preciso, e o faz de forma precisa. Naquele momento ele soube ver que eu precisava daquilo: silêncio e concentração. Sou grato por isso e por sua companhia. Sem alarde fui até a proa e soltei os três cabos que mantem o Malagô preso ao píer. Dei um pouco de ré e o Edu soltou os cabos de popa.

O vento, então, jogou o Mala - livre de cabos - para cima do barco do lado: o Off Line. Lá fui eu evitar alguns arranhões. Espero que o Eduardo Coton não leia isso, mas na verdade o Mala se jogou ainda outras duas vezes para cima do Off Line e  fiquei imaginando quantos anos teria que trabalhar para pagar o prejuízo... 

Bem, como eu previa não foi mesmo fácil sair da vaga: a ré do Mala nunca foi lá muito católica e controle sobre ela não é bem uma realidade. Então ficamos em um vai e vem bastante constrangedor, sem que eu soubesse afinal se ele daria a popa para o canal ou a proa. Dei à vante, à ré, à vante de novo, mais uma ré... Fingi que estava no controle até que finalmente houve espaço para guinar para boreste e nos safar dos outros barcos e das estacas que os mantem amarrados no píer do clube. Se alguém, porém, me perguntar como foi que ele saiu, eu simplesmente não sei o que dizer!

Não ter plateia nesse momento me ajudou muito, pois sei que várias sugestões de manobras seriam dadas pelos amigos e sei, também, que a maioria delas não funciona para um casco como o do Classe Brasil. Esses barcos têm muitas obras vivas e manobras apertadas não são o forte desse tipo de casco.

Entramos no canal do porto e aos poucos o "Velho Mala" foi acordando de sua hibernação. Algo que gostei e que me surpreendeu é que o motor estava muito mais forte, provavelmente resultado da nova bomba injetora, cabeçote, aneis e pistões. O casco extremamente limpo também ajudou nisso. Atingimos uma velocidade de quatro nós aos mil e oitocentos giros. Antes essa velocidade só era atingida aos dois mil e oitocentos e eu creditava essa lerdeza enervante ao hélice de passo errado.

Quando passamos o ISO preto, logo depois do Aquário de Santos,  avisei o Malagô que içaríamos sua genoa (que está montada com garrunchos, pois ano passado tirei o enrolador). Ele assentiu e em poucos instantes lá estava ela armada e nos levando para São Vicente. Desliguei o motor e ficamos velejando só de genoa, aos dois nós, para lá e para cá, variando entre  popa, alheta, través O vento estava fraco demais e subir a mestra não compensava, pois o rumo predominante era o popa e ela não armaria bem com aquela merreca. Eu conheço meu barco - e a partir dali ele voltava a ser isso: "o meu barco". 



Logo me assegurei que estava tudo bem com o novo estaiamento e com a regulagem do mastro. Perguntei ao Edu se ele queria uma coca, mas ele preferiu deixar para depois. Larguei o leme, desci até a cabine, peguei a coca, fiquei sentado na escada conversando com o Edu - que estava a minha frente - abri a latinha e percebi que sim, o Malagô havia voltado. Digo isso porque simplesmente ninguém havia assumido o leme quando eu desci para pegar a coca, nem depois, e o barco continuava ali, no rumo, sozinho, sem ninguém no leme (não tenho piloto automático). Ah, eu adoro fazer isso!  


O vento entrou e foi hora de abrir a mestra. Mas ai o Malagô disse não. Por erro meu a retranca não ficou travada e por conta disso o movimento para lá e para cá danificou o trilho de subida dos slides. Ok, sem mestra dessa vez. Em uma relação é sempre preciso saber ceder um pouco. Velejei mais um bocadinho e tomamos o caminho da roça, pois por falar em relação a dona Priscila mandou eu voltar para casa às 14h, e seu eu tenho medo do Mala imagina o medo que não tenho do dona patroa...

Colocar o barco na vaga foi outra novela. Mas já tenho planos esboçados para resolver esse problema e na próxima saída a manobra será perfeita! Agora é voltar a colocar o bumbum no convés e dominar o danado outra vez.

E vamos no pano mesmo!

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Travessia Ubatuba Buenos Aires - Soneca - Parte 05 - Final.

Boas.

Dia desses eu estava no Soneca, durante sua estadia aqui no Clube Internacional de Regatas. Enquanto o Tio Spinelli falava de seus planos e os marujos Bruna e Vitor se debruçavam sobre cartas náuticas, ansiosos com a viagem, eu me peguei pensando em quanto aquele barco era diferente, comendo um naco de doce de banana. 

O Soneca é um barco espartano. Não tem luxos como ar condicionado, geladeira elétrica ou convés de teca. Aliás em seu convés pode-se andar calçado, coisa que me agrada por demais! A comida é feita em conservas e com isso no meio do oceano pode-se comer um bife a rolet com cheiro de recém cozido. O casco é um tanque de guerra.

A bandeira da Argentina hasteada na cruzeta do Soneca.

Cada coisa em seu interior não está lá à toa. Cada item tem sua função específica e está em lugar determinado. Não raro a gente escuta o Tio dizer: "Pega aquilo que está no segundo armário da cabine de proa, a bombordo, em uma caixa amarela de tampa transparente". E sempre a tal coisa está lá, do jeito que ele falou. Em uma travessia, em especial em uma travessia longa como a que o Soneca fez, ter tudo arrumado a bordo e ter uma mapa mental da arrumação é uma questão de sobrevivência. 

O Spinelli tem uma sintonia com o mar e com seu barco que hoje em dia é algo cada vez mais raro. Ele é um dos poucos velejadores que hoje em dia têm alma de explorador. Tem uns seis GPS a bordo, mas sabe usar o sextante. Estiva cabos de um jeito simples e que nunca dá enrosco. Prefere ir no vento. Ele sabe que um veleiro é mais do que um objeto de lazer dominical ou um item de status. Mais do que isso, é uma máquina de viajar, ávida por conhecer o que existe além do horizonte. O Tio conversa com o Soneca e sabe ouvir o que ele diz. E vice versa. É algo que quem é apaixonado pelo mar, por aventuras, por navegação, enfim, adora ver. 

Não, o Soneca não é um barco luxuoso. Mas é um barco que vai para qualquer lugar - coisa que muito barco chique por ai não faz, em especial aqueles condenados a boiar no píer à espera de um verão que muitas vezes não vem.

Vitor Young em momento Soneca.
Ontem pela manhã o Soneca completou a travessia a que havia se proposto. De Ubatuba a Buenos Aires foram percorridas 1.226 milhas náuticas, ao longo de 24 dias e 04 horas - sendo que cerca de dez dias foram de exclusiva navegação (os demais foram em portos, a espera de tempo adequado). Houve escalas em Santos, Paranaguá, São Francisco do Sul, Joinville, Porto Belo, Florianópolis e Rio Grande. Na tripulação que chegou à capital portenha tivemos a Bruna Tau, de São José dos Campos, o Vitor Young, de Santos e o Silvio Guimarães, de Barretos. Ainda tivemos a companhia do José Eduardo e do Genésio por parte do caminho.

A tripulação: Vitor Young, Silvio Guimarães, José Spinelli e Bruna Tau.

Eu acompanhei tudo aqui do escritório e passei através do blog uma ínfima parte do que eles viveram. A verdade, porém, é que apenas quem esteve lá tem a dimensão do tamanho do feito, por mais que o Tio vá falar dessa travessia como uma simples ida até ali. Vivemos em um país que permanece de costas para muitas coisas, incluindo o mar - embora nossa vocação marítima proporcional aos mais de oito mil quilometros de costa. Passamos dia após dia inventando amarras e adiando o sonho que temos de ir lá ver, como se tivéssemos todo o tempo do mundo. Não, não temos.
Bruna, Vitor (com umalinda camiseta) e Silvio.

Eu viajei com eles, mas via Spot.

O Soneca na noite de Puerto Madero.

Por isso, mais do que registrar o final dessa travessia, eu gostaria de parabenizar enfaticamente a Bruna, o Vitor, o Silvio, o Genésio, o José Eduardo e, principalmente, o Tio Spinelli, por terem tido a coragem de ir até lá e ver o mundo com seus próprios olhos, por serem os protagonistas de suas próprias vidas.  

Agora é pensar na volta! Temos duas vagas!!!

E vamos no pano mesmo!

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Travessia Ubatuba Buenos Aires - Soneca - Parte 04 - Rio Grande

Boas!

O Soneca partiu de Floripa dia 09/11/2015 com destino a Rio Grande. Os ventos na casa dos 30 nós e as ondas a favor fizeram com que o valente barquinho batesse seu recorde de singradura: 152 milhas em quatro horas, apenas "no pano".

A saída de Floripa foi um pouco dificultada por dezenas de redes de pesca sem sinalização.; Algumas enroscaram no leme e hélice do Soneca e obrigaram o Capitão a fazer alguns mergulhos em águas frias.

A chegada ao Porto de Rio Grande aconteceu na manhã do dia 12/11. Eles haviam chegado antes disso e para entrar apenas de dia - como manda a prudência - diminuíram o passo ao longo da madrugada.

Em terra puderam desfrutar de prazeres mais simples, como fazer uma refeição "retos".




Nossos amigos partiram de Rio Grande no dia 15/11 e neste exato momento estão na altura de Montevideu.

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E vamos no pano mesmo!

domingo, 8 de novembro de 2015

Travessia Ubatuba Buenos Aires - Soneca - Parte 03 - Florianopolis

Boas!

Após terem deixado Paranaguá e chegado em São Francisco do Sul no dia 03/11, por volta das 20h00,  a tripulação do Soneca nada pôde fazer senão esperar por uma janela meteorológica para continuar a descida até Buenos Aires.

Vitor e Bruna a bordo do Soneca.

São Francisco do Sul / SC


Em São Chico nossos amigos foram muito bem recebidos pela velejadora Marina Bruschi, Diretora do Museu Nacional do Mar, a quem uma vez mais agradecemos por tudo e também pela lasanha vegetariana. Além disso aproveitaram a parada mais longa e fizeram alguns experimentos gastronômicos, como o "bolo torto" ( alguém esqueceu da trava do fogão!!!). Deram também entrevista para o programa da Izabel Pimentel no Youtube, falando sobre trabalhos e bordo e felicidade. 

Bolo adernado a 15 graus...




No dia 05/11 o Soneca avançou pela Baía da Babitonga e fez uma escala técnica em Joinville para abastecer o barco com água e diesel. No dia seguinte, assim que houve condições de tempo mais adequadas para a descida, partiram com destino a Porto Belo.

Iate Clube de Joinville


A travessia noturna até Porto Belo (completada no amanhecer do dia 07/11) foi feita com vento contrário, o que sem trocadilhos deixou o Capitão um tanto contrariado. Nesse mesmo dia, ao final da tarde, eles saíram para as  últimas trinta milhas que os separavam da capital catarinense, mas não sem antes receber visitas ilustres a bordo!

Elio Crapun visitando o Soneca.

Bruna visitando seu lugar favorito a bordo, em Porto Belo...

... e recebendo a visita de Nazle Tuffi, sua professora do colégio.

Veleiros e agendas, de fato, não combinam. Uma travessia que tinha tudo para ser feita em três dias foi realizada em quatorze. Mas nada é sem motivo e cada navegante está onde precisa estar, no tempo certo. 

Hoje o Silvio, novo tripulante, deve se juntar a turma e seguir com eles até a Argentina. 

A próxima perna do Soneca será de Floripa até o porto de Rio Grande, provavelmente sem escalas. Ao sul de Floripa a navegação exige mais cuidados e atenção, pois existem pouquíssimas opções de abrigo e paradas e, como já relatamos aqui, a Marinha do Brasil está fazendo treinamentos com munição real e na região há áreas interditadas para a navegação.

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E vamos no pano mesmo!

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Travessia Ubatuba Buenos Aires - Soneca - Parte 02 - Tiro, porrada e bomba!!!

Boas!

O Soneca deixou o porto de Santos no dia 30/10 com destino a Paranaguá. Foram apenas de genoa e no piloto automático sob ventos de leste (20 nós) e um pouco de mar. A embarcação fez uma excelente singradura: 145 milhas náuticas em apenas 24 horas! Nada mau para um 33 pés. Dessa vez  a tripulação não sofreu (muito) com o balanço das ondas e ao amanhecer do dia 31/10 o barco já estava ancorado no Iate Clube de Paranaguá.

O único detalhe dessa travessia ficou para a equipe de terra que sofreu com uma falha do Spot. O localizador pessoal parou de enviar posições às 10h00 do dia 30/10, quando o veleiro estava no través de Itanhaém. O problema já foi resolvido (aparentemente foi problema com as baterias, mas o Tio não ficou muito convencido) e na manhã de hoje a tripulação deixou Paranaguá com destino a São Francisco de Sul, onde esperarão outra janela de tempo. Há cerca de uma hora o Spot atualizou a posição: través de Guaratuba/PR (metade do caminho para São Chico). Além do Spot o Soneca conta com Epirb - um sinalizador acionado apenas em caso de emergências.


Essa parada não planejada em Guarujá trouxe alguns problemas para a tripulação, que está se virando para gerenciar víveres em excesso e gastos não previstos. O principal problema, contudo, é o atraso na data de chegada ao porto de Rio Grande. A data prevista inicialmente já foi para o espaço e por conta disso o veleiro irá cruzar uma área onde a Marinha do Brasil fará exercícios com tiro real... Será tiro, porrada e bomba!

De São Chico o Soneca partirá, enfim, para Florianópolis eum uma travessia que deve levar um dia e meio.

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E vamos no pano mesmo!!!



quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Travessia Ubatuba Buenos Aires - Soneca - Parte 01 - Arribada forçada

Boas!

Meu professor de direito processual penal, Pedro Garutti, costumava se divertir ao indicar aos alunos que lhe pediam opinião sobre o tema do TCC o assunto "arribada forçada". A graça estava no fato de a bibliografia sobre isso ser extremamente diminuta, o que torna praticamente impossível escrever as mínimas cinquenta páginas exigidas. Confesso que era mais engraçado para ele do que para quem estava na aflição de concluir logo o curso e que nem sabia o que era esse negócio.

A arribada forçada, em português, é a escala não programada do navio em um porto não previsto no plano de navegação, por conta de alguma situação excepcional. O conceito vem no art. 740 do então Código Comercial Brasileiro, que é de 1850 e ainda está vigente nessa parte: "Art. 740. Quando um navio entra por necessidade em algum porto ou lugar distinto dos determinados na viagem a que se propusera, diz-se que fez arribada forçada". Ainda segundo referido Código,  "Art. 741. São causas justas para arribada forçada: 1. Falta de víveres ou aguada; 2. qualquer acidente acontecido à equipagem [tripulação], carga ou navio, que impossibilite este de continuar a navegar; 3. temor fundado de inimigo ou pirata".

Pois foi isso o que aconteceu com o Soneca.

Como planejado nossa trupe zarpou de Ubatuba no dia 25/10/2015, às 15h38. O Tio Spinelli avançou para o lado de fora da Ilhabela, passando entre as ilhas Vitória e Búzios. O mar estava alto, com ondas de dois a três metros e o vento soprava de SE e E, na casa dos vinte nós. O barco ia muito bem, mas parte da equipagem...

O Genésio e o José Eduardo sofreram com o mar aberto. Enjoaram muito e logo ficou claro que eles não iriam conseguir continuar até Floripa.  Assim, às 07h20da manhã do dia 26, quando eles já estavam a quase quarenta milhas da costa e no través de Alcatrazes, o capitão optou por fazer uma arribada forçada e desembarcar os mareados em Guarujá. Havia risco de forte desidratação, com consequências severas. Como estavam muito afastados de terra, a entrada não programada em Santos levou ainda agonizantes doze horas. 




O veleiro foi para o Iate Clube de Santos e, depois, para o Clube Internacional de Regatas. Amanhã de manhã partirão apenas o Tio, o Vitor e a Bruna. A janela de tempo foi perdida e a perna que antes seria sem escalas, agora será feita com pelo menos uma parada em Paranaguá.

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E vamos no pano mesmo!



terça-feira, 27 de outubro de 2015

Santos Rio 2015 a bordo do Off Line

Boas!

Após duas largadas anuladas por conta de barcos que queimaram a partida, finalmente o Off Line cruzou o alinhamento entre a Comissão de Regatas - CR e a bóia. Começava a Santos Rio para a gente, às 12h45 de um sábado de céu púmbleo.

Eu fiz parte da tripulação reunida pelo dono do barco, Eduardo Coton, a quem desde já agradeço uma vez mais pela oportunidade e receptividade. Conosco estiveram ainda o Ronei e o Antonio Carlos, donos do veleiro Panda (um Fibramar 34), o Claudio Luiz Gregório (uma lenda viva da vela santista) e o Maurício, que é o marinheiro do Off Line e do Grandpa. Uma tripulação bastante heterogênea em todos os aspectos, mas tranquila quanto ao nosso único obejtivo: completar a prova antes do tempo limite. Nossos adversários seriam nós mesmos, como combinamos antes e como veríamos bem claramente um pouco antes de chegarmos ao Rio.

Conforme o previsto os ventos eram na casa de 15 nós, de  SE. O mar estava baixo e por todo lado havia nuvens de chuva a espreita. Até a Ilha da Moela seguimos mais aterrados, ganhando altura a medida que nos aproximavamos de Ilhabela.

No través de Alcatrazes um problema grave ficou claro: um pote de sardinha sei lá o quê vazou e derramou um líquido oleoso e gosmento que contaminou todo o conteúdo da geladeira. O rancho estava praticamente todo perdido, nos restando apenas bolachas, frutas e demais alimentos que não deixam ninguém feliz por três dias seguidos. Seria uma viagem (ainda mais) longa.Adeus escondidinho de carne seca, adeus macarrão gratinado, adeus comida boa, adeus.

Nós nos afastamos da costa menos do que deveríamos e percebemos isso quando tentamos passar a Ponta do Boi, do lado de fora da Ilhabela. Muitos bordos foram ncessários para vencer o vento contra, até que estávamos atrás da Ilha de Búzios.

Mais uma vez uma sina que tem me perseguido há algum tempo se mostrou viva e presente:  uma certa hora da madrugada eu olho em volta e estão todos dormindo, menos eu - pois alguém tinha que continuar tocando o leme... Ronco aqui, ronco lá... a noite seria longa.

E foi mesmo. Contei os segundos para o dia clarear e então chamei o Maurício, que de noite não pode levar o barco "porque não enxerga no escuro". Com certeza ele deve achar que eu tenho visão infravermelha ou coisa assim. "Eu tenho hipermetropia", se justificava. Coo se eu não tivesse também... Toquei o leme entre 23h00 e 06h00, com exceção do período entre 02h00 e 03h00 em que o Ronei me rendeu e tive uma certa esperança de que ainda havia solidariedade na Terra.

Quando o domingo amanheceu estávamos no través da Ilha da Vitória, já em Ubatuba. Passamos raspando pelo lado de fora dela. Assim que o Maurício assumiu o leme eu deitei do jeito que deu na cabine e dormi por duas horas. Mas alegria de pobre dura pouco, pois às 08h00 havia uma chamada geral onde passaríamos nossa posição e anotaríamos a dos outros barcos. O Gregório era nosso navegador e eu o ajudava nessa tarefa. Como ele é um pouco surdo, literalmente, nessa hora eu tinha que ajudá-lo. Resultado: não dormi mais. 

Como consolo presenciei o Maurício anunciar aos quatro cantos que estava bem e que não enjoava, mesmo que entre uma jura e outra fizesse voar litros de vômito para o mar!

Não dormi mas em compensação  não peguei mais no leme. Pelo menos não até o anoitecer, quando então o estranho fenômeno de os tripulantes irem dormir e me deixarem sozinho se repetiu. Para quem não sabe, eu odeio ficar no leme (Eduardo Coton, note que eu grifei essa parte, ok?!). Deus inventou o piloto automático, o leme de vento e o aluno de vela justamente para  a gente não ter que ficar no leme! Humpf!

Feito esse breve aparte, o fato é que após a Laje da Marambaia, que alcançamos em um bordo único e mais arribado a partir do través da Joatinga (de onde passamos tão distantes que sequer conseguimos ver), o vento aumentou e rondou para E. Foi ai que a prova começou a se tornar uma provação. O mar cresceu. Começamos a fazer longos bordos, bastante torturantes pelo pouco avanço aparente. Depois da Pedra do Sino, em Ilhabela, praticamente demos apenas dois bordos, para ganhar altura perdida com a deriva natural do barco.

Da Laje da Marambaia (onde vimos um golfinho que depois revelou ser um tubarão!) abrimos para o mar e quando voltamos para terra estávamos em Grumari. De lá abrimos novamente e caímos no final da Barra da Tijuca. Ao abrimos de novo nossos problemas ganharam um novo contorno. A corrente contra e o vento se intensificaram e para ajudar um navio patrulha quis chegar tão perto de nós que achei que fosse dar confusão. 

Então, lá fora, bastante amarados, houve uma Assembleia das Nações Unidas feita pelos membros da tripulação e após deliberações sensatas, democraticas, amistosas e cordiais (e em nada influenciadas pela fome, pelo frio, por andar adernado há mais de trinta horas, pela falta de banho há dois dias e mais um par de privações) o resultado foi eu novamente no leme, o Antonio Carlos me contando sobre suas experiências com relações internacionais e o Gregorio vigiando a navegação. Os demais foram dormir. Era pouco mais de meia noite.

Fizemos mais dois bordos bem longos e às 06h00 lá estávamos nós  no Arpoador, com o sol recém nascido e o céu finalmente limpo (vimos muita chuva pelo caminho, mas não pegamos nenhuma gota de água do céu). Eu trazia um sorrisinho no rosto e cantava o Samba do Avião sem parar, eufórico. Já me via cruzando a linha dali a poucos instantes, feliz, contente, vitorioso e ai...

"E ai" que não seria tão simples assim. Mas nem em sonho. Ali terminava uma regata e começava outra: entrar na Guanabara. Chegamos no Arpoador sob um leste de 25 nós. Mas esse  ventão logo tratou de cair  para dez, nove, oito, sete, seis, cinco... pois é. Acabou o vento. O mar virou um espelho. Faltavam ainda sete milhas para a chegada. O pessoal começou a acordar e pensar no filé a Oswaldo Aranha que o Antonio carlos falava o tempo todo.

Para resumir muito uma história longa (mas looooooooonga mesmo!), nós e muitos dos outros trinta barcos da regata levamos oito horas para cruzar a linha de chegada, incluindo um par de horas que perdemos pois ao chegar bem próximo da linha, vindos do Forte Santa Cruz, o vento intermitente acabou de vez e a maré nos empurrou com força para a Ponte Rio Niterói. 

Subimos a baía com uma paciência de Jó, a meio nó (até rimou). E depois de muita luta e esforços hercúleos, ouvimos a buzina pouco depois das 13h00 da segunda, 26/10/2015. Havia acabado! Nós vencemos nós mesmos.

Os aprendizados foram muitos e fazer uma navegada assim sempre nos causa impacto. A primeira coisa que se pensa é que no ano que vem, não faremos mais. Podemos até jurar isso. Mas ai passa um dia, passa outro e então... quem sabe ano que vem de novo, agora para fazer um tempo melhor que o dos outros barcos? Não tem jeito, essa é nossa vida...

E vamos no pano mesmo!

(em breve  fotos, em nova postagem).





quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Ubatuba - Buenos Aires e Santos - Rio

Boas!

No próximo dia 25 de outubro, domingo, o veleiro Soneca, do Capitão José Spinelli Neto dará início a travessia Ubatuba - Buenos Aires.



Spinelli, ou "Tio Spinelli" para os íntimos, é capitão amador e velejador há várias décadas, possuindo vasta experiência em navegação oceânica.  O veleiro Soneca é um Samoa 33 preparado para longas travessias. Foi  construído pelo próprio Tio e já está no Saco da Ribeira pronto para mais essa aventura!

Na tripulação teremos o Vitor , a Bruna , o José Eduardo, o Genésio e o Silvio, alunos de nossa escola de vela.

Faremos o acompanhamento dessa travessia aqui no blog, passando o maior número possível de detalhes.

A primeira perna será Ubatuba - Florianopolis e a previsão para o dia 25/10, data da partida, é bastante favorável: ventos de Leste e Nordeste, acima de dez nós. De Florianópolis, onde dois tripulantes desembarcam (Vitor e Genésio) e outro embarca (Silvio) a trupe parte para o desafiador porto de Rio Grande. Mas o grande desafio mesmo será a entrada no Rio da Prata, prevista para a segunda semana de novembro.

CLIQUE AQUI a partir do dia 25/10 e acompanhe as posições do Soneca em tempo real!

Enquanto isso eu irei enfrentar ventos contrários no veleiro Offline (Wind 34, do Eduardo Coton) em minha primeira Regata Santos - Rio.

O Spot do Offline pode ser acompanhado a partir de 24/10 CLICANDO AQUI!

E vamos no pano mesmo!

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Navegando em braile ...

Boas!

Em parceria com a empresa Brazil Boat Share realizamos mais uma turma de nosso curso básico de vela oceânica, dessa vez a bordo do veleiro Anarquia, um Pantanal 25 de propriedade compartilhada sobre o qual eu já falei aqui antes.

Na tripulação tivemos o casal Rogerio e Alessandra, o Julio e o Rafael, na sexta, e o Felippe, que se juntou ao grupo no sábado. Por conta de uma frente fria as condições estiveram um pouco fora do usual: muitos carneirinhos, chuva, sensação térmica lá embaixo e visibilidade baixa.

No sábado, em especial, as nuvens baixas nos permitiam ver apenas alguns prédios da orla de Santos. De resto havia apenas uma névoa branca e o som dos sinais sonoros dos navios que entravam e saiam do porto mais movimentado do país.

Por segurança conduzimos a aula na altura do ISO Vermelho, que tem boa distância da orla e fica igualmente afastado do canal dos navios. Mantivemos, ainda, a navegação em um eixo Leste-Oeste, sempre em orça e afsatando da orla. Assim ficava mais fácil para o timoneiro se guiar pela agulha magnética, nossa referência visual mais confiável (havia um chartplotter também). Falamos bastante sobre navegação em mau tempo, tomada de rizo e homem ao mar e aquela situação especial dava um certo realismo às explicações.  A tripulação se adaptou muito rapidamente ao barco e os bordos foram muito bem executados, mesmo com ventos acima de 15 nós, ainda resultado da frente. 

Após abordamos na prática a manobra de fundeio - dessa vez fizemos na Praia do Góes e não no Sangava-, resolvi levar os marujos para terra, pois todos estavam muito molhados e alguns com muito frio. Velejar tem que ser divertido, não congelante. 

No dia seguinte havíamos programado a terceira aula do básico, indo até a Ilha da Moela. Mas conversamos e resolvemos adiar para um dia mais ameno. Como bem disso o Julio, deixemos o mau tempo para quando atravessarmos o Drake! A ida à Moela teria sido bem interessante, pois a todos os ingredientes daquela panela foi adicionada uma bela... RESSACA! Culpa do Rafael, aposto.

Agradeço aos meus amigos dessa turma, que se comportaram de maneira exemplar mesmo em condições não muito confortáveis. O excelente moral a bordo ajudou a superar o frio e até me faz esquecer que vez ou outra os cabos ainda eram chamados de corda...

E vamos no pano mesmo!

Galeria:

Rogerio (centro), Alessandra, Juca, Julio e Rafael.

Alessandre a Juca.

Julio e Rafael.



Julio.

O valente Anarquia.




segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Curso de vela na Represa Guarapiranga

Boas!

Durante o mês de setembro nosso instrutor Alexandre Dangas ministrou o curso básico de vela para o Maurilo a bordo do Fast 230 + Bakanna na represa Guarapiranga.  Esse curso é regular e acontece sempre que há interessados. A vantagem é que está dentro da cidade de São Paulo e o regime de ventos é espetacular.

Vejam o que nosso amigo e agora velejador Maurilo achou da experiência:

"Bem, velejar pra mim é outra maneira de se viver, descobri esse ano o que é de fato velejar, entrei no Colégio Naval e logo escolhi a equipe de Vela Oceânica. Que desafio! Aprendi tudo na raça do dia-a-dia como é esse esporte e continuo aprendendo... Tanto que procurei ajuda nessa área e descobri o Curso Baldoso, mas o que me alegrou mesmo foi ter a instrução aqui na Represa Guarapiranga!! Isso mesmo em uma represa, eu moro a uns 40min dela e não acreditei que era possível velejar. Foi um tremendo equívoco! Cheguei lá e fui recebido pelo Alexandre Dangas de uma simpatia sem igual com o +Bakanna e foi surpreendente olhar pra represa naquele final de semana e ver vários veleiros. Muito bom!

E mais bom ainda foi poder velejar junto, a princípio pensei que não era possível conduzir o veleiro apenas com duas pessoas e saímos da marina até sem motor, fomos no pano mesmo! O Alexandre passava uma segurança que foi essencial pra mim, tive a liberdade de conduzir a embarcação com muita confiança, ele tirou todas as minha dúvidas! Um grande velejador. Sou muito grato por isso. Já nos primeiros dias já sabia fazer muita coisa. Não sei se fui um excelente aluno mas acho que deu pra passar pra outra fase! Já penso em breve fazer o intermediário haha. Enfim, foi muito boa a experiência e acreditem velejar na Guarapiranga é tão bom quanto no mar".

E ai, está esperando o quê? Venha velejar com a gente! A próxima turma na represa começa dia 17/10/2015!

E vamos no pano mesmo!

Galeria:

(c) Ricardo Stavale - Veleu,  amigo!!!








quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Propriedade compartilhada de veleiros.

Boas!

Domingo passado eu fui velejar com o Rodrigo e com a Simone, dois alunos que fizeram o curso conosco em maio desse ano e que recetemente compraram seu próprio veleiro, o Anarquia, um Pantanal 25  projetado pelo  Cabinho.



Foi a primiera vez que velejei em um Pantanal 25 e gostei muito do barco. O espaço, como característica dos barcos do Cabinho, é de um 28 pés e o desempenho não decepciona: com uma leve brisa de cinco nós entramos e saímos da baia algumas vezes, fazendo bons ângulos de orça. O cockpit  é bastante espaçoso e bem arranjado e a ausência do estai de popa torna-o desimpedido. A popa é aberta e tem um excelente acesso ao mar. A boca é estreita (pois o barco foi projetado para ser rebocado em nossas estradas por um carro de passeio), o que faz com que o ajuste de velas tenha de ser bem feito, sob pena de comprometer o rendimento. Como resultado tem-se um barquinho ao mesmo tempo técnico e divertido. 


O Anarquia é um barco muito bem cuidado e mantido e eis ai um ponto interessante, que me fez pensar sobre algumas coisas. O Rodrigo e a Simone não o compraram inteiro, mas sim uma cota, administrada pela empresa Brazil Boat Share, com sede em Guarujá.

O sistema de compartilhamento de embarcações no Brasil ainda está em desenvolvimento e por isso envolto em mitos e mistérios. O maior entrave, na minha opinião, está no fato de as pessoas desenvolverem uma relação pessoal muito íntima com o barco. Mais do que a extensão da própria casa, um veleiro acaba virando a escova de dentes do dono. E escova de dentes, barraca de camping e a mulher da gente, não se compartilha.


Quando se tem condições de estar sempre no barco isso não é um problema. Vai-se sempre e faz-se como eu: dez horas consertando, limpando e arrumando, para uma ou duas horas velejando!

Agora, para quem não mora perto do barco e volta e meia é atropelado pelos compromissos de trabalho e família, a propriedade compartilhada, se bem administrada, tem várias vantagens. 

Nós chegamos no domingo de manhã na Marina Astúrias. O barco, que fica guardado no seco, já estava na água, limpo, abastecido e montado. Foi só ligar o motor e sair. Depois subir as velas e velejar. Na volta, depois de várias horas velejando, foi só deixá-lo no pier. A subida, arrumação e etc fica por conta da empresa administradora.  Entre a data da compra e a primeira velejada 'solo' do casal, passaram vários finais de semana que eles simplesmente não teriam condições de usar o barco. 

Eis ai uma belíssima vantagem: se o Rodrigo e a Simone ficarem um mês sem poder ir ao barco, ele estará lá: limpo, cuidado, pronto para uso. Não ter que se pegar em Nossa Senhora dos Veleiros na Poita ao menor aviso de mau tempo emitido pelo Gajeiro pode ser interessante. 



Sim, é possível contratar um marinheiro e vivenciar essa mesma tranquilidade. 

Porém entra ai outra vantagem desse sistema: o custo. 

Em nossa escola de vela nós usamos um fast 230, o Grandpa, que foi comprado por mim em sociedade com dois alunos que depois se tornaram amigos. Para o nosso 23 pés pagamos R$ 545,00 por mês só de marinheiro.  Como somos em três vivenciamos um pouco da experiência do compartilhamento: cada mês um de nós paga essa despesa. Acreditem, dói muito menos, assim como doeu muito menos pagar 1/3 do valor do piloto automárico e do GPS. 

O Malagô (40 pés), que é apenas meu, não tem marinheiro, pois o preço aqui em Guarujá para ele esteve estratosférico e fora de minhas possibilidades. A limpeza é feita por mim ou por algum marinheiro avulso. Nele eu pago tudo sozinho e já fali um par de vezes. Na propriedade compartilhada há uma clara redução de custos.

Um problema que se coloca é o do tempo de uso e quando se poderá usar o barco.

No caso da Anarquia o sistema é interessante: casa cotista começa o ano com 600 pontos. Cada vez que usa o barco "gasta" 10 pontos, sendo que a reserva é feita totalmente on line. Se mais de um cotista quiser usar o barco em um mesmo dia, abre-se uma disputa, que é resolvida após um leilão: quem der mais pontos pelo dia, "leva o barco". Esse sistema me apreceu melhor do que calendários pré-estabelecidos, que nem sempre casam com a previsão do tempo. Se em um final de semana chuvoso ninguém usar o barco, ninguém perdeu a vez. 

Uma coisa que me incomoda em alguns sistemas é o número de cotistas, às vezes mais do que dez. No Grandpa nós somos em três e a coisa funciona muito bem, pois o Cassio mudou para os EUA, o Aruã não usa - só paga - e eu só uso, rs. Além disso somos amigos e usamos o baco juntos várias vezes. No Anarquia, salvo engano, são seis cotistas, sendo um deles o administrador. 

Se os cotistas se conhecerem e interagirem a coisa tende a funcionar melhor do que no esquema cada um por si. Comprar com amigos pode ser uma boa saída para isso.

O fundamental, porém, é que a empresa administradora faça seu papel e consiga deixar o barco em perfeitas condições após o uso. Outra coisa que penso ser importante é "engessar" as alterações do barco. Ele deve ser o mais completo possível (para dispensar a colocação de novos equipamentos) e, também por isso, não se deve estimular muitas modificações, pois para tanto todos os cotistas precisam estar em acordo e democracia demais, às vezes, é algo que leva ao conflito.

Enfim, vou acompanhar de perto esse sistema, mas para quem tem a vida corrida e o barco é apenas mais uma coisa a se desfrutar, me pareceu um sistema inteligente, prático e economicamente viável (a cota sai por R$ 18.900,00), desde que você não queria fazer do barco a sua casa ou a sua vida, como eu tenho feito com o Malagô, nem faça questão de pendurar dentro da cabine aquele quadrinho que você trouxe de Porto Seguro.



E vamos no pano mesmo!



quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Impressões do curso de vela oceânica, por Bruna Tau

Boas!

A visão que esse blog traz de nossos cursos de vela é sempre a minha e há tempos eu queria inverer isso, trazendo as impressões de algum aluno ou aluna. Pois na última turma de nosso curso básico de vela oceânica, em Ubatuba, a bordo do Soneca e sob a batuta do Tio Spinelli isso finalmente aconteceu. A serelepe Bruna Tau, (ex)lancheira e atual velejadora que está prestes a ser salva e se tornar proprietária e moradora de um veleiro, resolveu nos presentear com um belo relato sobre seus três dias no Saco da Ribeira a bordo do Soneca. 

Por isso, hoje, vamos de Bruna Tau mesmo!

"Minha paixão foi sempre o mar. Vivi a bordo de diversas embarcações, meu pai teve algumas, o negócio dele era pesca esportiva. Há dois anos e meio minha mãe e meu pai faleceram. Foi ai que o mar voltou à tona. Corri para comprar minha primeira embarcação. Foi a motor. Legal, mas vi que o veleiro sim traria o que eu queria e seria o melhor jeito de me sentir mais perto dos meus pais; desde então comecei a pesquisar. Achei o Juca na rede e conheci o Tio, pessoa encantadora. Uma semana depois fui fazer o curso básico com ele.


Chegando no veleiro Soneca, onde eu faria o curso, o Tio me recebeu com um sorriso e me perguntou se eu estava bem. Eu disse que não poderia estar melhor! Mal sabia ele que eu estava a realizar um sonho, que ali era onde eu mais me sentia confortável.

Começamos o curso um pouco antes do planejado, já que eu e mais um colega estávamos ansiosos. O Tio nos passou uma parte da teoria e nos explicou muitos nós de marinheiro. rapidinho consegui aprender, estava apreensiva em talvez não absorver todo o conteúdo.



No dia seguinte cedinho chegaram mais dois alunos, um casal. èramos quatro alunos bem diferentes. O dia passou voando. Foi di´ficil, era muita coisa nova. Mas o Tio com toda a paciência e tato nos explicava tudinho, porém eu ainda me perguntava de de fato conseguiria aprender tudo. Foi a mesma senação de quando fui a autoescola, não conseguia coordenar tudo, não conseguia olhar todos os espelhos. Assim me senti no Soneca naquele primeiro dia.



Já no segundo dia o Tio, com toda aquela experiência e feeling botou todo mundo para navegar sozinho! Incrível! Eu nem acredito que cheguei navegando no escuro, sozinha, só sentindo o vento na pele. Pensei "que bruxaria é essa?" Hahaha, bruxaria nenhuma, o Tio é um cara muito competente, experiente, acho que isso é inato, ele nasceu com esse feeling todo, bota qualquer um para velejar em dois tempos. 


Já no terceiro dia foi só alegria. Praticamos mais algumas manobras e velejamos com bastante tranquilidade. Eu não pdoeria estar mais feliz. Estou ansiosapelo curso intermediário e com saudades daqueles dias, do pessoal, de ser embalada ao dormir pelo Soneca e da comida da Tia!"

Obrigado, Bruna, por seu relato. Tenho certeza de que em breve minha família encontrará a sua, em alguma praia por ai, e nossas filhas brincarão até cair no sono.  

Fotografias: Bruna Tau.

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Cusco Baldoso na loja do #SAL

Boas!

Vocês com certeza já conhecem ou pelo menos ouviram falar sobre a websérie #SAL, produzida, dirigida e apresentada pelo velejador (entre outras coisas) Adriano Plotzki. Com belas imagens e excelente argumento e produção, a cada lua nova um novo episódio vem ao ar (canal no Youtube) trazendo um pouco sobre a vida de quem faz do mar e de veleiros a sua casa ou o seu modo de viver. O meu episódio favorito ainda é o dia 12:



Mas a verdade é que a cada novo episódio a gente se surpreende por ter sido no mínimo tão bom quanto o outro. 

Essa semana o #SAL evoluiu e lançou uma loja virtual, onde podem ser comprados desde produtos com a marca da websérie (uma caneca, por exemplo), até passeios e cursos de vela. E nós, como não poderia ser diferente, embarcamos nessa e estamos divulgando nosso curso básico de vela oceânica nas bases Guarujá e Ubatuba.

A loja está muito bem estruturada e as inscrições para nossos cursos são feitas on-line!

Visite, conheça e ajude a manter essa projeto que hoje é o principal canal de difusão da vela de cruzeiro e lazer! É só clicar na imagem.



E vamos de #SAL mesmo! 


quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Como instalar a sonda do GPS Garmin sem furar o casco.

Boas!

Nosso Fast 230, o Grandpa, está equipado com um GPS Garmin 441s, aparelho que traz chartplotter (carta naútica) e sonda (ecobatímetro/profundidade). No começo do mês nosso amigo e sócio no barco Cassio Souza instalou a nossa sonda, de forma que agora possuimos dois ecobatímetros: o antigo e o do GPS.

Pouca gente sabe, mas é possível instalar a sonda por dentro do casco, sem precisar fazer nenhum furo. O melhor é que isso é bem fácil e barato e pode ser feito por vc mesmo. Entenda o que o Cassio fez:

1. Escolha um lugar próximo à proa do barco. O ecobatímetro não indica a profundidade do leito marinho à frente, mas sim a profundidade de um eixo cônico a partir de onde ele está instalado. Fazer a instalação na popa, por exemplo, poderá trazer uma indicação de profundidade diferente  do que aquela que há na proa. Em um barco de sete metros de comprimento, como o Grandpa, é perfeitamente possível a popa indicar dois metros de profundidade enquanto sob a proa há apenas um metro. O resultado nesse caso seria encalhe ou colisão na certa! Com a sonda à vante se a coisa começar a ficar complicada pode ser que ainda dê para manobrar e safar a onça. Por isso instale a sonda o mais a vante que for possível. 



No caso do Grandpa o Cassio escolheu o paiol de proa.

2. Uma vez determinado o local, limpe bem a fibra e retire o máximo que for possível de sujeira e gorduras. Com um pouco de estopa use 'solução desengordurante' para essa limpeza, produto vendido em lojas de materiais de construção e tintas.



3. Compre um cano de esgoto largo e alto o suficiente para caber a sonda inteira com uma sobra na altura. È importante comprar a tampa também, pois é dela que sairá o fio para o GPS. Fixe o pedaço de cano com adesivo de base epoxy no casco. Ele deve ficar bem fixo e não pode permitir vazamentos - isso é muito importante!


4. Após passar o fio pela tampa e posicionar a sonda rente ao casco, preencha o interior do cano - com a sonda dentro - com creme rinse (Neutrox!) ou gel para ultrassom. Depois disso tampe o cano e cole a tampa, para evitar que o líquido interno vaze.  A função desse líquido é evitar a presença de ar entre o casco e a sonda. Àgua não serve, pois cria bolhas e bolsões de ar com o movimento.





5. Pronto. A sua sonda deve estar funcionando. A nossa está operando 100%, tanto na água quanto com o barco no seco (foto). Um pequeno inconveniente é que com esse método a gente perde a temperatura a água, pois a indicação que o equipamento faz é a temperatura do líquido em que está imerso, mas é melhor e menos complicado do que furar o casco.


Essa técnica não funciona bem em barcos de madeira, mas apenas em cascos de fibra, aço e alumínio. No Malagô, onde temos um Garmin 541s, tivemos que instalar a sonda por fora. 

E vamos sondando mesmo!