segunda-feira, 23 de novembro de 2015

A primeira vez, de novo...

Boas!

Sábado de manhã o dia amanheceu cinzento, em contraste com a sexta anterior de céu azul e sol forte. Encontrei o Eduardo Colombo ainda na ponte Edgard Perdigão antes das 9h30. Ao embarcar na catraia que leva até a sede náutica do Clube Internacional de Regatas vi no caderno de embarque que pouca gente estava por lá e era assim mesmo que eu queria. Desde o dia anterior estava conversando com o Malagô sobre a gente dar uma volta e esse seria o dia.

(C) Eduardo Colombo
Devo confessar que a relação que eu tenho com esse barco nem sempre é fácil e acordá-lo depois de oito meses sem velejar me deixava nervoso. Eu simplesmente não sabia se ele estava com a mesma vontade que eu... Se ele quisesse ficar no píer, acreditem, haveria pouca coisa no mundo que o faria mudar de ideia. O Malagô é um veleiro muito, mas muito teimoso. 

(c) Eduardo Colombo

O fato é que eu não estou reconstruindo o barco inteiro à toa e eu iria tentar. Eu e o Eduardo embarcamos e de forma discreta começamos a retirar os trezentos toldos e capas... Fui até a Dona Lúcia e peguei duas cocas, uma água e dois quibes. O Edu é um cara legal e tem uma  qualidade que eu aprecio muito: só fala quando é preciso, e o faz de forma precisa. Naquele momento ele soube ver que eu precisava daquilo: silêncio e concentração. Sou grato por isso e por sua companhia. Sem alarde fui até a proa e soltei os três cabos que mantem o Malagô preso ao píer. Dei um pouco de ré e o Edu soltou os cabos de popa.

O vento, então, jogou o Mala - livre de cabos - para cima do barco do lado: o Off Line. Lá fui eu evitar alguns arranhões. Espero que o Eduardo Coton não leia isso, mas na verdade o Mala se jogou ainda outras duas vezes para cima do Off Line e  fiquei imaginando quantos anos teria que trabalhar para pagar o prejuízo... 

Bem, como eu previa não foi mesmo fácil sair da vaga: a ré do Mala nunca foi lá muito católica e controle sobre ela não é bem uma realidade. Então ficamos em um vai e vem bastante constrangedor, sem que eu soubesse afinal se ele daria a popa para o canal ou a proa. Dei à vante, à ré, à vante de novo, mais uma ré... Fingi que estava no controle até que finalmente houve espaço para guinar para boreste e nos safar dos outros barcos e das estacas que os mantem amarrados no píer do clube. Se alguém, porém, me perguntar como foi que ele saiu, eu simplesmente não sei o que dizer!

Não ter plateia nesse momento me ajudou muito, pois sei que várias sugestões de manobras seriam dadas pelos amigos e sei, também, que a maioria delas não funciona para um casco como o do Classe Brasil. Esses barcos têm muitas obras vivas e manobras apertadas não são o forte desse tipo de casco.

Entramos no canal do porto e aos poucos o "Velho Mala" foi acordando de sua hibernação. Algo que gostei e que me surpreendeu é que o motor estava muito mais forte, provavelmente resultado da nova bomba injetora, cabeçote, aneis e pistões. O casco extremamente limpo também ajudou nisso. Atingimos uma velocidade de quatro nós aos mil e oitocentos giros. Antes essa velocidade só era atingida aos dois mil e oitocentos e eu creditava essa lerdeza enervante ao hélice de passo errado.

Quando passamos o ISO preto, logo depois do Aquário de Santos,  avisei o Malagô que içaríamos sua genoa (que está montada com garrunchos, pois ano passado tirei o enrolador). Ele assentiu e em poucos instantes lá estava ela armada e nos levando para São Vicente. Desliguei o motor e ficamos velejando só de genoa, aos dois nós, para lá e para cá, variando entre  popa, alheta, través O vento estava fraco demais e subir a mestra não compensava, pois o rumo predominante era o popa e ela não armaria bem com aquela merreca. Eu conheço meu barco - e a partir dali ele voltava a ser isso: "o meu barco". 



Logo me assegurei que estava tudo bem com o novo estaiamento e com a regulagem do mastro. Perguntei ao Edu se ele queria uma coca, mas ele preferiu deixar para depois. Larguei o leme, desci até a cabine, peguei a coca, fiquei sentado na escada conversando com o Edu - que estava a minha frente - abri a latinha e percebi que sim, o Malagô havia voltado. Digo isso porque simplesmente ninguém havia assumido o leme quando eu desci para pegar a coca, nem depois, e o barco continuava ali, no rumo, sozinho, sem ninguém no leme (não tenho piloto automático). Ah, eu adoro fazer isso!  


O vento entrou e foi hora de abrir a mestra. Mas ai o Malagô disse não. Por erro meu a retranca não ficou travada e por conta disso o movimento para lá e para cá danificou o trilho de subida dos slides. Ok, sem mestra dessa vez. Em uma relação é sempre preciso saber ceder um pouco. Velejei mais um bocadinho e tomamos o caminho da roça, pois por falar em relação a dona Priscila mandou eu voltar para casa às 14h, e seu eu tenho medo do Mala imagina o medo que não tenho do dona patroa...

Colocar o barco na vaga foi outra novela. Mas já tenho planos esboçados para resolver esse problema e na próxima saída a manobra será perfeita! Agora é voltar a colocar o bumbum no convés e dominar o danado outra vez.

E vamos no pano mesmo!

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Travessia Ubatuba Buenos Aires - Soneca - Parte 05 - Final.

Boas.

Dia desses eu estava no Soneca, durante sua estadia aqui no Clube Internacional de Regatas. Enquanto o Tio Spinelli falava de seus planos e os marujos Bruna e Vitor se debruçavam sobre cartas náuticas, ansiosos com a viagem, eu me peguei pensando em quanto aquele barco era diferente, comendo um naco de doce de banana. 

O Soneca é um barco espartano. Não tem luxos como ar condicionado, geladeira elétrica ou convés de teca. Aliás em seu convés pode-se andar calçado, coisa que me agrada por demais! A comida é feita em conservas e com isso no meio do oceano pode-se comer um bife a rolet com cheiro de recém cozido. O casco é um tanque de guerra.

A bandeira da Argentina hasteada na cruzeta do Soneca.

Cada coisa em seu interior não está lá à toa. Cada item tem sua função específica e está em lugar determinado. Não raro a gente escuta o Tio dizer: "Pega aquilo que está no segundo armário da cabine de proa, a bombordo, em uma caixa amarela de tampa transparente". E sempre a tal coisa está lá, do jeito que ele falou. Em uma travessia, em especial em uma travessia longa como a que o Soneca fez, ter tudo arrumado a bordo e ter uma mapa mental da arrumação é uma questão de sobrevivência. 

O Spinelli tem uma sintonia com o mar e com seu barco que hoje em dia é algo cada vez mais raro. Ele é um dos poucos velejadores que hoje em dia têm alma de explorador. Tem uns seis GPS a bordo, mas sabe usar o sextante. Estiva cabos de um jeito simples e que nunca dá enrosco. Prefere ir no vento. Ele sabe que um veleiro é mais do que um objeto de lazer dominical ou um item de status. Mais do que isso, é uma máquina de viajar, ávida por conhecer o que existe além do horizonte. O Tio conversa com o Soneca e sabe ouvir o que ele diz. E vice versa. É algo que quem é apaixonado pelo mar, por aventuras, por navegação, enfim, adora ver. 

Não, o Soneca não é um barco luxuoso. Mas é um barco que vai para qualquer lugar - coisa que muito barco chique por ai não faz, em especial aqueles condenados a boiar no píer à espera de um verão que muitas vezes não vem.

Vitor Young em momento Soneca.
Ontem pela manhã o Soneca completou a travessia a que havia se proposto. De Ubatuba a Buenos Aires foram percorridas 1.226 milhas náuticas, ao longo de 24 dias e 04 horas - sendo que cerca de dez dias foram de exclusiva navegação (os demais foram em portos, a espera de tempo adequado). Houve escalas em Santos, Paranaguá, São Francisco do Sul, Joinville, Porto Belo, Florianópolis e Rio Grande. Na tripulação que chegou à capital portenha tivemos a Bruna Tau, de São José dos Campos, o Vitor Young, de Santos e o Silvio Guimarães, de Barretos. Ainda tivemos a companhia do José Eduardo e do Genésio por parte do caminho.

A tripulação: Vitor Young, Silvio Guimarães, José Spinelli e Bruna Tau.

Eu acompanhei tudo aqui do escritório e passei através do blog uma ínfima parte do que eles viveram. A verdade, porém, é que apenas quem esteve lá tem a dimensão do tamanho do feito, por mais que o Tio vá falar dessa travessia como uma simples ida até ali. Vivemos em um país que permanece de costas para muitas coisas, incluindo o mar - embora nossa vocação marítima proporcional aos mais de oito mil quilometros de costa. Passamos dia após dia inventando amarras e adiando o sonho que temos de ir lá ver, como se tivéssemos todo o tempo do mundo. Não, não temos.
Bruna, Vitor (com umalinda camiseta) e Silvio.

Eu viajei com eles, mas via Spot.

O Soneca na noite de Puerto Madero.

Por isso, mais do que registrar o final dessa travessia, eu gostaria de parabenizar enfaticamente a Bruna, o Vitor, o Silvio, o Genésio, o José Eduardo e, principalmente, o Tio Spinelli, por terem tido a coragem de ir até lá e ver o mundo com seus próprios olhos, por serem os protagonistas de suas próprias vidas.  

Agora é pensar na volta! Temos duas vagas!!!

E vamos no pano mesmo!

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Travessia Ubatuba Buenos Aires - Soneca - Parte 04 - Rio Grande

Boas!

O Soneca partiu de Floripa dia 09/11/2015 com destino a Rio Grande. Os ventos na casa dos 30 nós e as ondas a favor fizeram com que o valente barquinho batesse seu recorde de singradura: 152 milhas em quatro horas, apenas "no pano".

A saída de Floripa foi um pouco dificultada por dezenas de redes de pesca sem sinalização.; Algumas enroscaram no leme e hélice do Soneca e obrigaram o Capitão a fazer alguns mergulhos em águas frias.

A chegada ao Porto de Rio Grande aconteceu na manhã do dia 12/11. Eles haviam chegado antes disso e para entrar apenas de dia - como manda a prudência - diminuíram o passo ao longo da madrugada.

Em terra puderam desfrutar de prazeres mais simples, como fazer uma refeição "retos".




Nossos amigos partiram de Rio Grande no dia 15/11 e neste exato momento estão na altura de Montevideu.

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E vamos no pano mesmo!

domingo, 8 de novembro de 2015

Travessia Ubatuba Buenos Aires - Soneca - Parte 03 - Florianopolis

Boas!

Após terem deixado Paranaguá e chegado em São Francisco do Sul no dia 03/11, por volta das 20h00,  a tripulação do Soneca nada pôde fazer senão esperar por uma janela meteorológica para continuar a descida até Buenos Aires.

Vitor e Bruna a bordo do Soneca.

São Francisco do Sul / SC


Em São Chico nossos amigos foram muito bem recebidos pela velejadora Marina Bruschi, Diretora do Museu Nacional do Mar, a quem uma vez mais agradecemos por tudo e também pela lasanha vegetariana. Além disso aproveitaram a parada mais longa e fizeram alguns experimentos gastronômicos, como o "bolo torto" ( alguém esqueceu da trava do fogão!!!). Deram também entrevista para o programa da Izabel Pimentel no Youtube, falando sobre trabalhos e bordo e felicidade. 

Bolo adernado a 15 graus...




No dia 05/11 o Soneca avançou pela Baía da Babitonga e fez uma escala técnica em Joinville para abastecer o barco com água e diesel. No dia seguinte, assim que houve condições de tempo mais adequadas para a descida, partiram com destino a Porto Belo.

Iate Clube de Joinville


A travessia noturna até Porto Belo (completada no amanhecer do dia 07/11) foi feita com vento contrário, o que sem trocadilhos deixou o Capitão um tanto contrariado. Nesse mesmo dia, ao final da tarde, eles saíram para as  últimas trinta milhas que os separavam da capital catarinense, mas não sem antes receber visitas ilustres a bordo!

Elio Crapun visitando o Soneca.

Bruna visitando seu lugar favorito a bordo, em Porto Belo...

... e recebendo a visita de Nazle Tuffi, sua professora do colégio.

Veleiros e agendas, de fato, não combinam. Uma travessia que tinha tudo para ser feita em três dias foi realizada em quatorze. Mas nada é sem motivo e cada navegante está onde precisa estar, no tempo certo. 

Hoje o Silvio, novo tripulante, deve se juntar a turma e seguir com eles até a Argentina. 

A próxima perna do Soneca será de Floripa até o porto de Rio Grande, provavelmente sem escalas. Ao sul de Floripa a navegação exige mais cuidados e atenção, pois existem pouquíssimas opções de abrigo e paradas e, como já relatamos aqui, a Marinha do Brasil está fazendo treinamentos com munição real e na região há áreas interditadas para a navegação.

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E vamos no pano mesmo!

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Travessia Ubatuba Buenos Aires - Soneca - Parte 02 - Tiro, porrada e bomba!!!

Boas!

O Soneca deixou o porto de Santos no dia 30/10 com destino a Paranaguá. Foram apenas de genoa e no piloto automático sob ventos de leste (20 nós) e um pouco de mar. A embarcação fez uma excelente singradura: 145 milhas náuticas em apenas 24 horas! Nada mau para um 33 pés. Dessa vez  a tripulação não sofreu (muito) com o balanço das ondas e ao amanhecer do dia 31/10 o barco já estava ancorado no Iate Clube de Paranaguá.

O único detalhe dessa travessia ficou para a equipe de terra que sofreu com uma falha do Spot. O localizador pessoal parou de enviar posições às 10h00 do dia 30/10, quando o veleiro estava no través de Itanhaém. O problema já foi resolvido (aparentemente foi problema com as baterias, mas o Tio não ficou muito convencido) e na manhã de hoje a tripulação deixou Paranaguá com destino a São Francisco de Sul, onde esperarão outra janela de tempo. Há cerca de uma hora o Spot atualizou a posição: través de Guaratuba/PR (metade do caminho para São Chico). Além do Spot o Soneca conta com Epirb - um sinalizador acionado apenas em caso de emergências.


Essa parada não planejada em Guarujá trouxe alguns problemas para a tripulação, que está se virando para gerenciar víveres em excesso e gastos não previstos. O principal problema, contudo, é o atraso na data de chegada ao porto de Rio Grande. A data prevista inicialmente já foi para o espaço e por conta disso o veleiro irá cruzar uma área onde a Marinha do Brasil fará exercícios com tiro real... Será tiro, porrada e bomba!

De São Chico o Soneca partirá, enfim, para Florianópolis eum uma travessia que deve levar um dia e meio.

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E vamos no pano mesmo!!!